A Sony/PlayStation emitiu seu novo relatório corporativo para 2024 e diante e, como esse é o meu conteúdo predileto, não podia deixar a oportunidade de fazer uma análise desse documento passar.
Caso você tenha perdido meu texto mais recente, nele eu analiso os números fiscais da empresa pra destrinchar a polêmica estratégia de remasters da PlayStation. Leia abaixo:
Continuando, você deve estar se perguntando: pra que zorra eu preciso saber disso? Bom, esses relatórios servem como uma espécie de bússola para a companhia e mapeia os próximos passos para os acionistas.
Através dele, podemos notar padrões e entender no que a empresa vai investir no curto, médio e longo prazo.
Cinematografia e criançada
Logo no começo do documento já temos dois indicativos fortes. A Sony declara o seu propósito como empresa: “Encher o mundo de emoção, através do poder da criatividade e tecnologia.” Com essa declaração, já podemos gabaritar que a PlayStation vai continuar com seu apetite por narrativas cinematográficas.
Um ponto “escondido” logo nas primeiras páginas do documento é que os slides apresentam várias crianças, indicando que a Sony/PlayStation enxerga esse público como um alvo prioritário. Isso explica os recentes investimentos em jogos para crianças, como Astro Bot e LEGO Horizon Adventures.
Como o público fiel da PlayStation está envelhecendo e passando a ter outras prioridades, como constituir uma família, dar conta do emprego e adquirindo outros hobbies, a PlayStation precisa fidelizar os jogadores mais jovens. A tarefa vai ser um desafio tremendo, afinal, as crianças estão cada vez mais imersas em seus tablets e celulares, além de estarem concentradas em pouquíssimas IPs como Fortnite, Roblox, Free Fire e Minecraft.
A “resposta” da PlayStation pra isso foi aliar LEGO, uma das IPs mais irreverentes com esse teor de “construção” com uma de suas franquias carro-chefe que é Horizon. É LEGO com dinossauros, logo, dificilmente a empreitada vai dar errado.
E paralelo a isso temos Astro Bot. O “novo” mascote da marca é basicamente uma síntese de toda a história da PlayStation e segue fielmente o motto da Sony: “Encher o mundo de emoção, através do poder da criatividade e tecnologia.“
O próximo passo deve ser um console portátil propriamente dito. Se o PS Portal foi de fato um teste, ele acabou passando com louvor, indicando que existe um apetite voraz dos consumidores da PlayStation por um novo PSP.
Além das Fronteiras
Na décima segunda página do relatório, o CFO da Sony, Hiroki Totoki, deixa claro o direcionamento da Sony a partir desse atual ano fiscal. O desejo da gestão é aumentar cada vez mais a sinergia entre os departamentos.
O slide dessa claro que a meta até 2026 é aumentar o lucro líquido para 10% ou mais. Atualmente a PlayStation opera com uma margem de 6%. A Sony como um todo opera com uma margem de 9%. Um aspecto curioso é que a etapa atual do planejamento acaba no final do ano fiscal 2026 e, pelo andar da carruagem, o PS6 será lançado no começo do ano fiscal 2027, chegando juntamente com o Sexto Plano da Sony Corp.
Agora você deve estar se perguntando, como eles pretendem aumentar a lucratividade de 6 pra 10% em 3 anos? De acordo com Totoki, isso será feito: “expandindo o número de usuários ativos e engajamento dos usuários, além de promover jogos first party produzidos pelos nossos estúdios internos, além de iniciativas voltadas para o PC.”
Em suma, pense em todos aqueles first parties guardados que todos ficam pedindo por trailers e afins.. Eles vão sair do forno. Ghost of Yotei, Death Stranding 2, Marvel’s Wolverine, projeto da Bend, IP nova da Santa Monica, IP nova da Naughty Dog.. Após um ano fiscal propositalmente fraco no quesito first party, a PlayStation pretende mudar isso completamente a partir do próximo ano fiscal que começa em Abril de 2025.
Um ponto interessante no relatório é que o executivo enxerga os filmes como o principal motor de integração entre os departamentos e a ideia através desse setor é explorar o potencial das IPs que a Sony possui. Em suma, a gente deve ver vários filmes, séries e animes de propriedades conhecidas.
Mundos colidem
Outro aspecto interessante do report é o desejo da Sony em explorar mais as IPs tanto no mundo virtual quanto no mundo real. No campo dos jogos por exemplo eles citam três vertentes:
- Descobrir talentos através dos programas de incubação como India Hero Project
- Adaptação live action de jogos
- Experiências das IPs na vida real, como parques temáticos
Um ponto importantíssimo é que o executivo cita iniciativas em IA e machine learning para: “entregar nossas IPs rapidamente e com um custo menor para um leque maior de fãs.” No campo dos games, outras publishers como a EA já foram bem mais categoricas em exemplificar como a IA pode acelerar e baratear o processo de desenvolvimento. Pelo visto, isso vai ser uma tendência!
No relatório a PlayStation afirma que usou machine learning no desenvolvimento de Marvel’s Spider-Man 2. Eles usaram um software de reconhecimento de voz em vários idiomas, sincronizando automaticamente os lábios com as falas de cada personagem, reduzindo drasticamente o tempo necessário para concluir o processo.
Um ponto importantíssimo é que Totoki revelou que a Sony vai integrar a Crunchyroll na PlayStation Network, passando a usar as contas, formas de pagamento, segurança e infraestrutura de dados. A ideia é transformar a PlayStation Network em uma plataforma de engajamento.
Outro ponto mencionado é que eles pretendem padronizar todos os IDs de usuários para todos os serviços fornecidos pela Sony. Um aspecto curioso é que eles mencionam bastante a Unreal Engine no relatório, enfatizando o investimento estratégico feito na Epic, a dona da engine.
A Sony tem usado a Unreal Engine para várias aplicações que perpassam os games, indo desde a clipes musicais até uma ferramenta voltada para a produção de filmes e séries. Com isso, podemos apostar no surgimento de mais e mais jogos da PlayStation sendo feitos na Unreal Engine 5. Existem rumores que indicam que o próximo projeto da Bend está sendo feito na Unreal Engine.
Uma PlayStation mais inclusiva
Similar a quase todas as outras multinacionais, a Sony visa se tornar uma companhia cada vez mais inclusiva. A empresa aproveitou a ocasião para detalhar como ela pretende fazer isso no campo dos games:
- Assegurar acessibilidade em hardwares, controles e jogos, com o desenvolvimento de periféricos dedicados.
- Tornar o uso de energia mais eficiente entre hardware e serviços
- Continuar a reduzir o uso de plástico nas embalagens
- Cuidar de direitos ambientais e humanos em todo o contexto da cadeia de suprimentos da Sony
Em suma, as práticas estão mais voltadas à acessibilidade e iniciativas ambientais. Quem acompanha os exclusivos pode ver isso na prática. A companhia de fato está investindo mais e mais em tecnologias que permitem que seus games sejam desfrutados por qualquer pessoa, mesmo aquelas com algum tipo de deficiência motora, visual ou auditiva.
Dados fiscais
O segmento de jogos e serviço gerou 4,2 bilhões de yen no ano fiscal 2023. Para comparação, o valor foi de 3,6 bilhões de yen no ano fiscal 2022. A Sony apontou alguns motivos que levaram ao aumento de 600 milhões de yen:
- Aumento da venda de jogos third-party, assim como aumento na venda de addons
- Impacto positivo na varição cambial entre moedas estrangeiras
Curiosamente, dois fatores negativos foram elencados:
- Queda na venda de first parties
- Aumento do prejuízo na venda de hardwares por conta de promoções
Para mitigar um dos problemas, a PlayStation anunciou no começo desse ano fiscal que não iria fazer nenhuma promoção para o PS5.
Apesar do aumento das vendas gerais, a margem de lucro da Sony Corp. como um todo caiu de 1,3 bilhões de yen no ano fiscal 2022 para 1,2 bilhões no ano fiscal 2023.
Por dentro da receita da PlayStation
No ano fiscal de 2023, a receita da PlayStation foi dividida da seguinte forma:
- Hardware: 29%
- Conteúdos adicionais (como DLCs e moedas premium): 25%
- Jogos digitais: 20%
- Serviços: 13%
- Outros: 9%
- Jogos físicos: 4%
O slide acima revela alguns dados interessantes. O primeiro é que a PlayStation já espera uma queda nas vendas do PS5 por que o console está entrando na segunda metade do seu ciclo de vida.
O futuro da PlayStation
O lema da PlayStation segue o mesmo: Ser o melhor lugar pra jogar (o famoso slogan – The Best Place to Play). A mensagem de Hideaki Nishino, CEO de Plataforma da PlayStation e a de Hermen Hulst, CEO dos Estúdios PlayStation, é a mesma: aumentar o alcance e atingir novas audiências.
Isso será feito através do investimento em serviços, dispositivos, e jogos para o console, PC e mobile, além, claro, das adaptações para o cinema e TV.
A mentalidade no geral segue a mesma. A ideia dos CEOs é investir em novas IPs de gêneros variados, crescendo o negócio para além do console, atingindo grupos nos ecossistemas do PC, mobile e serviços.
E, pra quem achou que o fiasco de Concord ia causar algum tipo de mudança de perspectiva, não causou. Eles voltaram a citar o investimento em jogos live service. Isso pode ser explicado pelos indicadores que a PlayStation considera ser os seus principais:
- Unidades vendidas do PS5
- Usuários ativos na PSN
- Horas jogadas/engajadas totais por usuário
- Receita de jogos além do console
Hoje o PS5 alcançou a marca de 61.7 milhões de unidades vendidas e existem 116 milhões de usuários ativos na PSN. De acordo com a PlayStation, os donos de um PS5 jogam mais e gastam mais dinheiro na loja.
Eles tabém confirmaram que a PlayStation Plus é um serviço lucrativo. A ideia para o futuro próximo é continuar lançando produtos que elevam a “experiência PlayStation” por meio da tecnologia. Um portátil vem aí?
Em relação aos estúdios, o relatório deixou claro que teremos uma maior colaboração entre os estúdios com a Crunchyroll. Será que o sonho de um anime de Bloodborne vai ser realizado? Existe um rumor antigo que indicava que teríamos animes de Sekiro e Ghost of Tsushima, mas até hoje nada..
E esse é o fim da nossa análise. Goste você ou não, a mensagem é bem clara: a PlayStation agora é muito mais do que uma caixa para jogar e a ideia da gestão é atingir o maior número possível de pessoas, independente de onde elas estejam e joguem.
Um ponto curioso é que eu senti falta de um maior detalhamento sobre a iniciativa mobile. Já faz uns 2 anos que a companhia fez investimentos direcionados à esse setor e, diferente do segmento PC, não vimos nenhuma novidade substancial até o momento.
Você gostou dessa análise do relatório corporativo da PlayStation (2024)? Conta pra gente nos comentários, deu um baita trabalho pra fazer!