Inovação. Esse é um conceito que pode aparecer de maneiras diferentes no mundo dos games. Existe certa inovação que vem com os avanços tecnológicos de hardware e software. Há inovação ligada ao surgimento de novos gêneros e estilos de gameplay únicos. E até mesmo aquelas pequenas inovações incrementais que aparecem a cada novo título lançado em uma mesma franquia. Isso, só para citar alguns exemplos.
Contudo, embora esses vários tipos de inovações sejam sempre muito bem-vindos, a verdade é que está cada vez mais difícil vermos inovações verdadeiramente impactantes surgirem na indústria dos games — principalmente quando falamos do âmbito AAA. Devido a diversos fatores (que incluem, por exemplo, o aumento nos custos e no tempo de desenvolvimento), as maiores publicadoras têm apostado cada vez mais nas mesmas ideias, gêneros e estilos de jogos. Ao invés de arriscar com conceitos novos e criativos, optam por investir no “certo”, naquilo que sabem que vai fazer sucesso.
E é claro que existe certo valor nesse tipo de experiência. Há um motivo para que jogos mais formulaicos continuem cativando tantas pessoas. Afinal, pode ser bastante prazeroso experienciar um título familiar, resgatar a nostalgia do passado, ou ainda controlar um personagem com um estilo de gameplay ao qual você já está habituado. Foi justamente por isso que o estilo de plataforma 2D da série Mario se manteve relevante, mesmo ficando estagnado por algum tempo. No final das contas, mesmo os títulos mais derivativos da era New Super Mario Bros. ainda traziam uma experiência divertida, embora pouquíssimo inovadoras. 11 anos após o último título inédito da série 2D, Super Mario Bros. Wonder chega para mudar isso.
Novo reino, novas ideias
Tudo começa com uma premissa simples e direta. Na fase de abertura do jogo, vemos Mario e sua trupe visitando o Reino Flor, um lugar colorido, belo e pacífico… Isso é, até a chegada de Bowser. Como de costume, o vilão clássico chega para causar confusão, mas dessa vez as coisas tomam uma nova proporção quando ele se apossa de uma Flor Fenomenal. Esse artefato poderosíssimo (que possui um papel muito especial em toda a aventura de Super Mario Bros. Wonder) faz com que Bowser se funda ao castelo do Príncipe Florian. A partir daí, resta aos nossos heróis enfrentar os exércitos do Rei dos Koopas e trazer a paz de volta ao Reino Flor.
Como outros jogos da série 2D, a narrativa de Super Mario Bros. Wonder serve mais como um pontapé inicial para o que o jogo tem de melhor a oferecer: o gameplay. Nesse sentido, Wonder eleva a barra quando comparado com basicamente qualquer outro jogo da franquia. De cara, mesmo sem considerar os novos Potencializadores (nome dado em português aos Power Ups), nem mesmo os diversos efeitos únicos oferecidos pelas Flores Fenomenais, Wonder oferece uma experiência na qual o simples ato de controlar os personagens é um deleite por si só, já que os controles são ágeis, responsivos e oferecem uma expressividade sem igual.
Veteranos das aventuras 2D de Mario reconhecerão de cara algumas das habilidades mais básicas de locomoção presentes na série de longa data, mas tudo está mais ágil e agradável do que nunca. Os atos básicos de andar, correr e pular formam a base acessível para uma experiência de plataforma 2D nostálgica, porém o jogo não se limita a isso. Outros movimentos mais avançados como a “bundada”, o pulo em paredes e o salto giratório (apenas para citar alguns) formam uma jogabilidade simples de começar, mas com uma profundidade surpreendente, que é explorada em sua plenitude nas fases mais desafiadoras.
Além do refinamento em termos de jogabilidade, outra coisa que impressiona em Wonder desde os momentos iniciais é a sua nova direção de arte e trilha sonora. Embora possuísse um gameplay agradável para sua época, com level design divertido e interessante, uma das maiores críticas à série “New” estava em seu visual, que era pouco inspirado e bastante derivativo. Super Mario Bros. Wonder parece vir como uma resposta direta para mostrar que a série 2D do Mario ainda consegue surpreender e encantar seus jogadores em todos os sentidos.
Fenomenal e “Marioavilhoso”
Escolher o Reino Flor e não o Reino Cogumelo soa como uma oportunidade para “limpar a mesa” e trazer algo completamente novo. Os jogadores ainda encontrarão alguns rostos conhecidos em Wonder, incluindo Gombas, Koopas, Boos e alguns outros personagens do roll clássico de vilões da franquia. Todavia, com exceção a esses elementos clássicos pontuais, a impressão que dá é que o Reino Flor traz uma quantidade absurda de novidades, incluindo um novo mapa (muito mais bonito e interativo), novos inimigos, novos potencializadores e — possivelmente o grande destaque de toda experiência —, os novos conceitos de gameplay oferecidos pelas Flores Fenomenais.
É até um pouco difícil descrever as Flores Fenomenais de uma maneira simples e sem estragar um pouco as surpresas presentes em Wonder, mas aqueles que viram os trailers do jogo podem ter percebido o seu verdadeiro potencial. Basicamente, elas são elementos coringas presentes em cada uma das mais de 150 fases do jogo, cujo efeito é modificar os visuais, transformar a jogabilidade e até mesmo desestabilizar completamente os conceitos mais básicos presentes em um jogo de plataforma 2D como Mario Wonder.
Algumas vezes, a Flor Fenomenal estará presente bem no seu caminho, sendo obrigatória para a progressão naquela fase. Em outros momentos, estará muito bem escondida, exigindo do jogador perspicácia em conseguir encontrá-la (além dos outros coletáveis presentes em cada fase). Além de ser importante para a progressão no jogo, você com certeza vai querer coletar todas as Flores, simplesmente para ver o que vai acontecer. Nesse sentido, é realmente impressionante ver a variedade de ideias e conceitos presentes em Super Mario Bros. Wonder.
Nos trailers do jogo, vimos Flores Fenomenais que fazem canos começarem a andarem, Flores que transformam nossos protagonistas em bolas com espinhos, e Flores que deixam todos os elementos da fase em preto-e-branco. Essas são, contudo, apenas alguns pequenos exemplos da enorme variedade de mecânicas e ideias oferecidas pelas Flores Fenomenais. Eu não quero dar nenhum outro exemplo para não estragar quaisquer surpresas, mas saibam que Super Mario Bros. Wonder repete conceitos pouquíssimas vezes (e quando o faz, adiciona novos contextos ou aumenta a dificuldade). O resultado é um jogo que te surpreende constantemente com ideias novas e únicas a cada nova fase.
Mais que inovação, revolução
Além da maluquice quase aleatória oferecida pelas Flores Fenomenais, Super Mario Bros. Wonder traz alguns outros elementos novos que adicionam ainda mais variedade à experiência. O primeiro deles são os novos potencializadores: a maçã elefante, a flor de bolha e o cogumelo broca (além do retorno da flor de fogo).
Cada um desses poderes amplia as habilidades dos nossos heróis de maneiras únicas. Com o elefante, você pode quebrar blocos ou bater em inimigos com sua tromba. Com as bolhas, você pode derrotar inimigos através das paredes, ou ainda criar plataformas temporárias em qualquer lugar da fase. Já a broca te permite perfurar o solo ou se prender ao teto de determinados cenários. Embora existam fases claramente pensadas para o uso de cada um desses potencializadores, Wonder oferece ao jogador a liberdade de carregá-los para qualquer fase do jogo. Isso amplia enormemente o fator replay do jogo, já que você pode encontrar caminhos escondidos mais facilmente com a ajuda de certos itens.
Um segundo elemento que traz uma variedade ainda maior para Super Mario Bros. Wonder são as insígnias. Essa mecânica inteiramente inédita na série possibilita liberar uma atividade passiva ou ativa que pode ser equipada no início de cada fase. Categorizadas em três tipos diferentes (insígnias de ação, insígnias e poder e insígnias avançadas), elas podem modificar enormemente os controles do jogador, ou ainda podem oferecer alguma vantagem extremamente necessária para determinadas fases.
Dependendo do seu estilo de jogabilidade, você pode ter preferência por determinada insígnia (eu, particularmente, me acostumei muito a utilizar a insígnia de pirueta flutuante), porém o jogo oferece diversas fases de desafio voltadas para insígnias específicas. Utilizar a insígnia de invisibilidade, por exemplo, deixará qualquer fase muito mais difícil do que o padrão, o que pode fazer com que a maior parte dos jogadores encarem essa insígnia como uma “piada” feita pelos desenvolvedores. Porém, existem fases em que você é obrigado a utilizá-la. O desafio é esse.
O verdadeiro Mario Wonder começa aqui
Eu também acho engraçado fazer uma referência a Dark Souls em um review de Super Mario Bros. Wonder, mas essa é uma das comparações mais interessantes que eu posso fazer para conseguir explicar como funciona o novo sistema de multiplayer da série. Em linhas gerais, o jogo oferece duas modalidades de multiplayer: local e online.
O modo local funciona de maneira similar ao que estávamos acostumados na série, com uma pequena diferença: não existe mais colisão entre os jogadores. Isso significa que até quatro pessoas podem dividir a mesma tela, colaborando para chegar o mais longe possível, enquanto encontram a maior parte dos coletáveis (ou, como geralmente acontece nesses casos, sair correndo feito loucos para ver quem chega primeiro ao final da fase). Contudo, os jogadores não conseguem mais agarrar uns aos outros para jogar os amigos nos precipícios. Os amantes do caos poderão ficar tristes, mas na minha opinião essa foi uma mudança positiva para tornar a experiência co-op local muito mais proveitosa.
Já no modo online, a Nintendo surpreendeu com uma escolha que, confesso, de início eu tinha achado bastante estranha: o multiplayer agora funciona com pessoas aleatórias, similar ao que acontece em um jogo da série Souls. Sim, você ainda pode chamar seus amigos online, e nesse caso o jogo funciona basicamente da mesma maneira que localmente. Contudo, você pode também deixar o modo online ligado, e o jogo te colocará aleatoriamente com pessoas que estejam jogando a mesma fase naquele momento.
Embora um online aleatório como esse possa parecer estranho para um jogo de plataforma 2D, ele funciona surpreendentemente bem em Super Mario Bros. Wonder. Os outros jogadores aparecerão na sua fase como fantasmas, que podem (se você quiser) ser ignorados totalmente. Contudo, existem algumas interações interessantes que podem ser feitas com os jogadores online, incluindo a colocação de painéis que podem ajudar os outros jogadores a serem revividos, ou ainda o envio de mensagens para avisar sobre a presença de um item ou segredo. Foram várias as vezes em que eu me vi ajudando ou sendo ajudado por pessoas totalmente estranhas.
A comparação com Dark Souls, contudo, não funciona quando falamos da dificuldade do jogo. Diferente de um jogo de plataforma como Celeste ou Super Meat Boy, a intenção de Super Mario Bros. Wonder é ser um jogo bastante acessível para todos os públicos. Isso não significa que o jogo não apresente desafios; eles estão lá, só que pode demorar um pouquinho até você chegar às fases mais difíceis.
Fala que eu te escuto
Como eu comentei no início do meu review, a narrativa de Super Mario Bros. Wonder não é muito mais do que uma premissa engraçadinha para dar um pontapé à aventura de Mario e sua turma. Todavia, diferente dos seus predecessores, Wonder possui figuras que aparecem constantemente para comentar sobre o que está acontecendo no Reino Flor. São as Flores Tagarelas.
Totalmente dubladas e presentes em praticamente todas as fases do jogo, essas Flores são utilizadas de diversas maneiras durante toda a aventura. Algumas delas dão dicas sobre segredos e coletáveis. Outras, fazem comentários engraçadinhos sobre o que está acontecendo naquele momento. É uma adição bastante bem-vinda para adicionar ainda mais dinamismo à experiência, mas, caso queira, você pode optar por silenciá-las.
Esse é o momento oportuno para destacar o fato de que Super Mario Bros. Wonder está totalmente localizado em português do Brasil — ou melhor, quase totalmente localizado. O trabalho de dublagem das Flores Tagarelas e de localização do jogo como um todo é excepcional, já que todos os textos do jogo foram adaptados à nossa realidade (há, por exemplo, uma referência direta a uma das obras de Machado de Assis). Infelizmente, nem tudo são flores (haha, entendeu?), já que as falas do Mario e demais personagens não foram localizadas.
Para mim, causou uma estranheza ver o jogo todo lindamente adaptado para português, (incluindo a dublagem das Flores Tagarelas), mas ainda assim ouvir Mario e sua trupe falando coisas como “It’s Mario time”, “Wonderful” e “Bye Bye”. É um detalhe pequeno, claro, que não estranha a experiência como um todo, mas ainda assim foi um detalhe que não deixou de me incomodar.
Review de Super Mario Bros. Wonder — Imperdível
No final das contas, Super Mario Bros. Wonder traz tantas novidades e tanta qualidade para o formato de plataforma 2D do nosso bigodudo italiano favorito, que o jogo não parece apenas uma inovação em relação a tudo o que veio antes, mas sim uma revolução no gênero de plataforma 2D como um todo.
Não teve um único momento durante as 12 horas e meia que levei para zerar o jogo principal que eu não estava com um sorriso no rosto, deslumbrado com cada uma das novas ideias apresentadas pelas Flores Fenomenais. Como se não bastasse, o jogo ainda reservou algumas das mais divertidas (e desafiadoras) fases para o final, escondidas como conteúdo extra ou mundo secreto.
Com um multiplayer que funciona surpreendentemente bem (o que, convenhamos, não costuma ser uma das maiores forças da Nintendo), um estilo artístico absolutamente fantástico, e um desempenho impecável, Super Mario Bros. Wonder oferece uma experiência de plataforma 2D absolutamente imperdível para todos aqueles que são amantes do gênero.
Trazendo melhorias e novidades em praticamente todas os aspectos da franquia, Super Mario Bros. Wonder é um dos melhores jogos de plataforma 2D já feitos. Do multiplayer às mecânicas únicas oferecidas pelas Flores Fenomenais, Wonder oferece um pacote que beira a perfeição.
- Jogabilidade
- Direção de arte
- Som (Trilha Sonora e Efeitos)
- Desempenho
- Desafio
- Localização