A Disney segue como líder absoluta quando se fala em animações, mas não há como negar que sua época de ouro foi a clássica. Nos anos 1930 a 1950, a produtora apresentou ao mundo conceitos surpreendentes que se destacaram não apenas por inovar nos termos de fluidez visual, mas também de revolucionar a capacidade criativa e técnica do cinema.
Infelizmente, as coisas mudaram bastante desde então, e raramente vemos algo com a qualidade de A Branca de Neve, Cinderela, Pinóquio e Dumbo. Porém, com a extensão do audiovisual para outras áreas, esferas como os games tiveram a chance de reviver a nostalgia dos veteranos e de levar essas propostas para novatos. E é nesse contexto que nasce Bye Sweet Carole.
O game de terror e “point-and-click” é um verdadeiro deleite para todos os sentidos humanos. E aqui, ninguém deve ser pego de surpresa: já por meio de seus primeiros materiais promocionais, foi possível observar que algo muito especial estava chegando. E chegou.
Adeus, doce Carole
O mundo não é mais o mesmo. Lana, que tem uma história e um apreço muito grande por sua amiga de infância, Carole, vê tudo desabar em poucos instantes. Com sua colega de orfanato misteriosamente desaparecida, ela entra em um loop de ansiedade e preocupação que a leva para terras além da realidade.
Proclamada como rainha do reino de Corolla, Lana vê sua residência, o orfanato Bunny Hall, e o próprio universo entrarem em colapso, com o surgimento de uma entidade maligna. Mas, ao que tudo indica, essa criatura, conhecida como Sr. Kyn, pode ter respostas sobre o paradeiro de Carole, mesmo que isso seja sua cartada final.

Porém, à medida que ela se aprofunda nesse reino mágico, o mundo que ela conhece começa a se fundir com o outro lado do espelho. E, agora, ela corre contra o tempo para salvar a vida de todas as pessoas que conhece… E também das que Lana pouco lembra.
Bye Sweet Carole é um game de terror e exploração inspirado em clássicos. Com amplo foco narrativo, o título se destaca por seus visuais e pela excelente cinematografia, impulsionada pelo estilo artístico à la era de ouro da Walt Disney, trilha sonora impressionante e um belíssimo trabalho de áudio, seja no sistema de som ou na dublagem.

Sua campanha leva em torno de 6h a 8h para ser completada, mas isso para marinheiros de primeira viagem. Já em relação ao gameplay, o título consiste em dez capítulos, onde cada um deles é composto por um puzzle ambiental de porte médio e dificuldade moderada, por algumas leves interações com NPCs e CGIs.
A história conversa bem com os tempos atuais, mas não atinge todo seu potencial por ser muito didática. Além disso, por discutir questões ideológicas profundas, ela cai no mesmo mal de títulos como Dragon Age: The Veilguard, onde alguns momentos indicam que os jogadores estão levando uma bronca em vez de serem levados à reflexão de pontos válidos.
Nesse sentido, também vale a pena elogiar as inspirações de Bye Sweet Carole. Veteranos sentirão claramente as referências ao Clock Tower original, com vários tipos de perseguidores ao longo da jornada, mecânica de esconderijos e estilo “rolagem lateral” com muito backtracking e “leva e traz” de itens.
Hora de esquentar a mente
Bye Sweet Carole é um jogo extremamente estimulante. Seus quebra-cabeças consistem em vários tipos de atividades, exigindo que Lana esteja atenta aos seus arredores e descubra meios engenhosos de atravessar os mapas, seja usando objetos menores (de inventário) ou móveis dos quartos e salas.
Os puzzles aumentam a dificuldade especialmente no ato 2, quando se interligam entre áreas e forçam os jogadores a buscar pistas, tanto por meio visual quanto escrito. Como o game está localizado em português do Brasil, as coisas ficam facilitadas mesmo para quem tem barreiras contra esse estilo.

Os quebra-cabeças também incluem viagens no tempo e alguns quick-time events. Por vezes, Lana não deve apenas andar para lá e para cá carregando objetos, mas também submetendo-se à pressão, pois quase sempre algo (ou alguém) estará vigiando seus passos e, posteriormente, indo atrás de acabar com sua jornada.
Em Bye Sweet Carole, os jogadores conhecerão vários perseguidores, cada um com seu próprio estilo de jogabilidade. Há uma criatura que aparece apenas nas sombras, outra que voa, a que corre em sua direção com um martelo de carne… Isso sem contar um excelente sistema de respiração baseado em Until Dawn: não basta apenas se esconder, mas prender o fôlego por um curto período.

E, diante disso, Lana pode morrer de diversas formas. Perder o equilíbrio em beiradas resulta em quedas, não apertar o botão na hora certa também resulta em mais quedas… E há outras formas também de ser prejudicado (narrativamente falando) caso falhe no QTE. Dessa forma, há muito com o que se preocupar enquanto progride na campanha.
Ah, e quase deixamos passar uma inovação em Bye Sweet Carole: os sistemas de transformação e de troca de personagens. A partir de certo momento, Lana pode se transformar em um coelho para atravessar locais estreitos, fugir com maior facilidade, saltar e alcançar entradas mais altas. Já a troca de personagens permite acessar as mecânicas de um outro herói, que consegue lutar contra monstros e remover sua cabeça para ajudar Lana a progredir.
Aventura cinematograficamente incrível
Por se inspirar em clássicos, Byw Sweet Carole tem um gameplay bastante simples e objetivo: todos os jogadores podem terminá-lo com um leve grau de paciência. Porém, é no conceito artístico que o título realmente brilha.
As animações adaptadas da era de ouro da Disney são impressionantes. Os devs acertaram em cheio ao deixá-las em 30 FPS, pois as taxas de quadro máximas facilmente gerariam um estranhamento e, consequentemente, a falta de identificação.

Os visuais das personagens e dos cenários estão incríveis, bem como a graciosidade dos movimentos e a reação natural de roupas, cabelos e do próprio mundo. Isso também se estende para o gameplay, pois Lana e os outros NPCs nunca ficam “parados” mesmo que você deixe o controle quieto. Bye Sweet Carole é uma experiência muito orgânica e nostálgica.
Os elogios também se estendem à trilha sonora e ao design de áudio. Os sons in-game e nas próprias animações são fantásticos e convincentes, enquanto as músicas funcionam muito bem com o contexto do game e deixam tudo muito mais emocionante. Por serem de época, eles trazem um senso de nostalgia gigantesco.

Infelizmente, isso veio a um certo custo. Há quedas de FPS ocasionais durante a campanha, enquanto as transições entre capítulos e áreas não são tão fluidas e sentem o impacto de longos tempos de carregamento. Além disso, há bloqueios de progressão em especial no capítulo 4, com impedimentos caso você execute uma ação antes do tempo “correto”.
O gameplay também pode ser um pouco travado em áreas que determinam maior agilidade. As transformações e mudanças de personagem não ocorrem como esperado algumas vezes e podem resultar em morte certa caso você não tenha apertado a tecla correspondente.
Terror leve: não se preocupe
Por ter um conceito familiar, Bye Sweet Carole não é um jogo de terror apelativo. Seus jumpscares são suportáveis e não exigem que você feche os olhos para nada. Já as lutas contra chefes e perseguições são bastante acessíveis e acabam se tornando intuitivas; sem qualquer tipo de frustração seja em jogabilidade ou no horror.
Aqui, há uma proposta mais visual da coisa: quando falamos em design das criaturas, vozes, composição atmosférica, contraste de luz e sombras… Mas, no geral, o título é bem mais leve quando comparado com seus primos distantes — no caso, a franquia Clock Tower e, até mesmo, Haunting Ground.
Bye Sweet Carole é uma doce e emocionante aventura
Bye Sweet Carole não engana: é uma aventura única, especial e muito bem construída. Sua grande virtude está no conceito artístico, com cenas em CGI de tirar o fôlego, design de áudio impecável e uma história profunda sobre temas bastante sensíveis para a sociedade.
O título também conta com muitas mecânicas únicas de jogo, que se transformam a cada capítulo e se provam úteis na resolução de puzzles. Esses, por sinal, são bem intuitivos e interconectados, exigindo um raciocínio lógico que nem de longe é apelativo.
A opção de 30 FPS claramente é planejada e deixa tudo ainda mais nostálgico, sem impactar absolutamente nada na jogabilidade. Porém, é possível observar que, em alguns momentos, as taxas caem em alguns quadros. Além disso, os tempos de carregamento longos e constantes podem incomodar quem busca uma jornada mais fluida, bem como bloqueios na progressão e inconsistências de estabilidade.
Já a história, com o tempo, parte para lados estranhos. Rapidamente ela muda de contexto com o fim do ato 2 e entra em um didatismo piegas, funcionando mais como um “esporro” devido às questões ideológicas do que um convite à reflexão.
Bye Sweet Carole é mais um indie imperdível neste ano de indies imperdíveis. Único em seu conceito e acessível para todos os públicos, ele pode ser a pedida certa para quem está buscando algo capaz de agradar em termos de jogabilidade e um terror mais leve.
Bye Sweet Carole é um drama de terror que emociona e faz refletir sobre diversas questões sociais — tudo em uma experiência fortemente inspirada por clássicos.
- Narrativa
- Jogabilidade
- Desempenho
- Visuais
- Som
- Diversão